quarta-feira, 27 de abril de 2011

Constituição portuguesa perdeu a ideologia marxista

Em entrevista publicada ao Correio do Minho, Paulo Sotero afirma que a Constituição portuguesa perdeu sua carga ideológica. Leia:
"A perda da carga ideológica, com o fim das referências 'marxistas', e a integração europeia, a 'reboque' de Bruxelas, foram os dois grandes propósitos das revisões constitucionais, defendeu hoje o professor universitário Paulo Otero. Em declarações à agência Lusa a propósito dos 35 anos da Lei Fundamental, que se assinalam esta semana com um colóquio no Tribunal Constitucional, o especialista destaca a 'preocupação de tirar as referências marxistas' e de 'ocidentalizar' o texto. No fundo, prosseguiu o docente, 'transformar a Constituição numa Constituição de uma democracia ocidental e pluralista, num sistema económico de mercado com preocupações sociais'. 'A Constituição a perder a carga ideológica que esteve subjacente à sua feitura', reforçou, referindo-se sobretudo às revisões de 1982 e 1989. O segundo 'grande propósito', prosseguiu, foi a 'integração europeia', onde Portugal andou a 'reboque' do que era decidido primeiro por Bruxelas ou pelos políticos. 'Não é a construção europeia que se harmoniza com a Constituição, mas a Constituição que tem de ser revista para se harmonizar com a construção e aprofundamento da União Europeia', criticou. Quanto às principais alterações introduzidas ao longo das sete revisões constitucionais realizadas até ao momento, Paulo Otero destaca a e xtinção do Conselho da Revolução, o que, defendeu, terminou com o conceito de uma democracia 'sob tutela militar'. 'A partir dessa data tivemos uma verdadeira democracia, plena, civil e sem a componente militar revolucionária que estava subjacente', afirmou. Por outro lado, o professor catedrático da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa sublinhou a criação do Tribunal Constitucional (TC), em 1982, mas apontou alguns 'vícios de género'. 'Um peso muito grande da Assembleia da República na designação dos juízes e a exclusão de juízes nomeados pelo Presidente da República', explicou. Quanto aos 'Direitos Económicos e Sociais', tema da sua intervenção no colóquio do Tribunal Constitucional, Paulo Otero lembrou que inicialmente estes estavam integrados na dinâmica socialista, como um 'instrumento ao serviço do modelo do Estado'. 'Os anos passaram e hoje estes direitos económicos e sociais são uma componente da dignidade humana. Deixaram de ter como centro o Estado e o projeto político do Estado para passarem a ter como centro a pessoa humana e a sua dignidade', reforçou."

Argumentos ruins: Opinião de Dworkin sobre o Tribunal de Roberts

Escrevendo no blog do New York Review of Books, Ronald Dworkin não poupa críticas à Suprema Corte sob presidência de John Roberts. No seu entender, o Chief Justice John Roberts e os justices Anthony Kennedy, Antonin Scalia, Clarence Thomas e Samuel Alito "continuam a revisar a nossa história constitucional". O estopim foram as recentes decisões, na linha de Arizona Christian School Tuition Organization v. Winn, que, a seu ver, abalaram o princípio da legitimidade da separação Igreja-Estado. Afirma que a maioria conservadora da Corte está empenhada em remover as proteções que impedem o governo de apoiar a religião. Para superar as decisões anteriores em sentido diverso, Dworkin diz que os justices se têm valido de "distinções tolas", "afirma embaraçosa" e outros "argumentos ruins". Sobre o justice Kennedy, escreve:
"Como a justice Elena Kagan apontou em sua dissidência devastadora, desde a decisão Flast, a Suprema Corte vinha afirmando unanimente que os contribuintes comuns tinham legitimidade para impugnar as vantagens fiscais das organizações religiosas .... Kennedy respondeu que... o caso Flast se aplicava aos créditos fiscais e não, como era o caso, aos gastos diretos, estando a Corte livre para ignorar os precedentes. Entretanto, as decisões da Corte deveriam ter sido levadas em conta. A distinção, feita por Kennedy, entre gastos diretos e créditos fiscais é muito frágil, devendo servir-lhe de reflexão e não de conforto".
Leia na íntegra aqui

sábado, 23 de abril de 2011

A resolução da ONU contra críticas às religiões

A Comissão de Direitos Humanos das Nações Unidas aprovou em 26/6/2009 uma resolução não vinculante, considerando a "difamação da religião" como uma violação dos direitos humanos. Há sérias preocupações de que o texto seja usado para justificar restrições à liberdade de expressão, principalmente nos países muçulmanos.
Segundo os críticos, ademais, o texto aprovado ampliaria o conceito de direitos humanos para proteger comunidades, neste caso, de crentes, em vez de proteger os indivíduos. De acordo com o Paquistão, proponente da medida, entretanto, "a difamação religiosa é uma séria afronta à dignidade humana, levando a uma restrição da liberdade dos seus adeptos e à incitação da violência religiosa".
A resolução instou os Estados a assegurar que santuários, locais e símbolos religiosos sejam protegidos, por meio de ações que impeçam a impunidade daqueles que se mostrarem intolerantes com as minorias étnicas e religiosas.
Leia a resolução na íntegra aqui
Veja abaixo a repercussão negativa nos Estados Unidos

Testemunhas de Jeová e transfusão de sangue: Irlanda

Durante as férias de Natal - às duas e trinta do dia 27 de dezembro para ser mais preciso - O juiz Hogan da Suprema Corte da Irlanda, no caso Temple Street, concedeu uma ordem para que fosse realizada uma transfusão de sangue para um bebê de quatro meses de idade contra a vontade dos pais, testemunhas de Jeová. O caso levanta questões importantes no que diz respeito tanto ao artigo 44 da Constituição, que protege a liberdade de religião, quanto aos artigos 41 e 42 da Constituição, que protegem a autonomia da família e delimitam o poder do Estado para intervir nos assuntos da família.
Artigo 42.5 permite a intervenção do Estado em "casos excepcionais", quando os pais falharem nas funções de proteção de seus filhos por razões físicas ou morais: "In exceptional cases, where the parents for physical or moral reasons fail in their duty towards their children, the State as guardian of the common good, by appropriate means shall endeavour to supply the place of the parents, but always with due regard for the natural and imprescriptible rights of the child".
A decisão anterior - nomeadamente o caso Baby Ann em 2006 - frisava que "razões físicas" envolviam questões que estavam fora do controle dos pais, enquanto "morais" eram motivos associados à culpa ou dolo deles. Hogan teve o cuidado de salientar que, neste caso, os pais estavam sãos e conscientes, além de profundamente preocupados com o bem-estar de seus filhos, mas firmes em sua crença religiosa. Apesar da redação falha do art. 42.5, cuja mudança fora aprovada - embora ainda não em vigor - com a retirada das expressões "excepcional" e "dever", mantinha-se o conceito de falta de responsabilidade dos pais.
Apesar do dilema que essa questão apresenta, Hogan declarou que "[o] teste para saber se os pais falharam para os fins do artigo 42.5 é, no entanto, de caráter objetivo, julgado pelos padrões seculares da sociedade em geral e da Constituição, em especial, independentemente de suas próprias visões religiosas subjetivas." Baseando-se na norma fixada no caso PKU em 2001 de que a intervenção do Estado seria justificada se houvesse uma ameaça iminente de morte ou lesão grave, Hogan decidiu que a liberdade religiosa dos pais, e sua autonomia como uma família constitucionalmente protegida, davam lugar à necessidade de proteger a vida da criança:
"O Estado tem um interesse vital em assegurar que as crianças estejam protegidas, de modo que um novo grupo de cidadãos bem-criados, saudáveis e educados possam vir à maturidade, devendo, portanto, ser dadas todas as oportunidades para desenvolver-se na vida. Este interesse pode prevalecer mesmo em face de outros direitos constitucionais fundamentais expressos. ... Dado que o artigo 40.3.2 obriga o Estado a proteger da melhor forma, por meio de suas disposições legislativas, a vida e a pessoa de cada cidadão, é incontestável que este Tribunal tenha competência (e, na verdade, um dever) para substituir as objeções religiosas dos pais sempre que ameaçarem a vida e o bem-estar geral da criança."
Esta é uma decisão importante e bem-vinda na medida em que, finalmente, esclarece a questão. O caso PBK não envolvia objeções religiosas (e os riscos para a criança não eram suficientemente graves para justificar a intervenção). O último acórdão sobre a questão das testemunhas de Jeová e a transfusão de sangue, Fitzpatrick v. K de 2008, fora decidido em razão da falta de capacidade, em vez de liberdade religiosa. Citando essa decisão, Hogan comentou, em obiter dictum, que um adulto devidamente informado e com capacidade mental plena estaria livre para recusar tratamento médico por motivos religiosos ou outros. Como a maioridade para o consentimento a um tratamento médico é de 16 anos, em conformidade com a seção 23 da Lei de delitos não-fatais contra a pessoa de 1997, surge uma pergunta interessante: como o tribunal irá decidir um caso em que uma adolescente com 16 ou 17 anos recusar-se a realizar uma transfusão de sangue por motivos religiosos ou não. Esse caso pode dar origem ainda a uma variedade de questões instigantes: e se os pais não apoiarem a decisão?

Europa: Conselho adota resolução sobre a pena de morte

A pena de morte é uma violação aos direitos humanos

Resolução 1807/2011

1. A Assembleia Parlamentar reitera sua oposição à pena de morte em qualquer circunstância. Ela se orgulha de sua contribuição exitosa em quase todos os países da Europa para extirpar essa penaIidade desumana e degradante, por ter feito de sua abolição uma condição de acesso ao Conselho da Europa.

Leia mais

sexta-feira, 22 de abril de 2011

Bambino Cattivo

Poesia para a alma e para o desespero.

Sono un vecchio bambino senza ricordi, solo leste ricognizioni tra nuvole di mosche tentando di ucciderle, prima di cena, quando la sera cade come un muro.

Eu sou uma velha
criança sem memórias, só destro
reconhecimento através de nuvens de moscas
tentando matar antes do jantar,
quando a noite cai feito um muro

É possível reconciliar controle de constitucionalidade e soberania parlamentar?

A professora israelense Rivka Weill escreveu interessante artigo em que analisa as possibilidades de reconciliação entre o controle de constitucionalidade e a supremacia do Parlamento, bem como os riscos da notwithstanding clause.
Resumo
Muitas vezes, é afirmado que uma Constituição formal não necessita do controle de constitucionalidade das leis. Pelo contrário, um país pode muito bem conceber outros mecanismos para proteger a Constituição da intromissão dos organismos políticos regulares. Surge a questão se o inverso é verdadeiro. Podemos imaginar um país que exerça a fiscalização constitucional sobre as leis sem possuir uma Constituição formal? Surpreendentemente, o sistema constitucional de Israel, antes da famosa decisão United Mizrahi Bank de 1995, oferece uma resposta afirmativa a essa pergunta.
Este artigo centra-se na experiência constitucional de Israel durante o seu período de fundação. Ele explica ainda o papel revolucionário realizado pela Suprema Corte de Israel para decidir "United Mizrahi Bank" no contexto da tradição de soberania parlamentar. Usando Israel como um estudo de caso dentro de um quadro constitucional comparado, o artigo oferece três lições importantes: Primeiro, ele explica como uma revisão judicial ao estilo norte-americano pode coexistir com a soberania parlamentar, não obstante a sua aparente contradição. Ele detalha ainda mais os mecanismos pelos quais a revisão judicial pode ser introduzida dentro de uma tradição de soberania parlamentar. Em segundo lugar, ele explica as raízes teóricas e históricas de poder judicial de revogar leis por meio de técnicas de interpretação na common law.
Enquanto a cláusula notwithstanding é considerada uma invenção original canadense, este artigo sugere que Israel tem explorado as técnicas de revogação legislativa antes da adoção da Carta Canadense. Por último, usando as experiências de Israel e do Canadá, que oferecem diversos alertas de como não se deve interpretar a "notwithstanding clause" se alguém deseja um constitucionalismo robusto.
Leia na íntegra aqui

Novo desafio à liberdade de comunicação nos EUA

A administração do presidente Barack Obama pediu à Suprema Corte para rever decisão do Tribunal de Apelação do Segundo Circuito, em Nova York, que considerou as restrições impostas, pela Comissão Federal de Comunicações (FCC), ao emprego de palavrões e nudez nos programas de rádio e tevê, inconstitucionais.
O principal argumento do tribunal fora a imprecisão dos termos empregados pela regulamentação da FCC: “We now hold that the FCC’s policy violates the First Amendment because it is unconstitutionally vague, creating a chilling effect that goes far beyond the fleeting expletives at issue here".
"A decisão da turma [integrada por] três juízes, em julho [de 2010], leva a sérias preocupações sobre a capacidade da Comissão para proteger as crianças e as famílias de programação televisiva indecente", disse o advogado geral da FCC Austin Schlick, "a Comissão continua empenhada em capacitar os pais e proteger as crianças, e espera que a Suprema Corte leve mais em conta os nossos argumentos."

quinta-feira, 21 de abril de 2011

Índice do Estado de Direito

O World Justice Project (WJP) divulgou, na semana passada, seu primeiro Rule of Law Index, um relatório de medição do grau de efetividade do Estado de Direito em 35 países.
O índice define "Estado de Direito" em torno de quatro "princípios universais":
1. O governo e os demais agentes públicos são responsáveis e submetidos a controles jurídicos;
2. As leis são claras, públicas, estáveis e justas, protegendo os direitos fundamentais, inclusive a segurança pessoal e o patrimônio;
3. O processo pelo qual as leis são aprovadas, executadas e aplicadas é acessível, justo e eficiente;
4. Acesso à justiça é promovido por juízes, procuradores, representantes e serventuários competentes, independentes e éticos, existentes em número e com recursos suficientes, refletindo, ademais, a composição das comunidades a que servem.
O índice mede o "Estado de Direito" por meio de dez fatores:
1. Governo de poderes efetivamente limitados (pela Constituição, pela legislatura, pelo judiciário, por auditores independentes. Penalização dos agentes governamentais que praticarem desvio de conduta; liberdade de opinião e expressão; vinculação ao direito internacional e sucessão no poder de acordo com o direito). Destaques: Suécia e Holanda.
2. Ausência de corrupção (agentes públicos e políticos não pedem ou recebem subornos nem praticam alcance, exercendo suas funções sem influências "impróprias"). Destaques: Suécia e Holanda.
3. Leis claras, públicas e estáveis (as normas são escritas de modo compreensível ao público, sendo publicadas e acessíveis facilmente, gozando de estabilidade).
Destaques: Suécia e Holanda.
4. Garantias de ordem e segurança (os crimes são efetivamente controlados; os conflitos civis, limitados, sem que os indivíduos recorram à violência para resolvê-los). Destaques: Cingapura e Japão.
5. Respeito aos direitos Fundamentais (garantia e efetividade dos direitos fundamentais, designadamente a igualdade, a vida e segurança pessoal, o devido processo legal e os direitos do acusado, as liberdades de opinião, de expressão, de crença e religião, de reunião e associação, bem assim a liberdade contra a interferência arbitrária na esfera privada e os direitos trabalhistas fundamentais). Destaques: Áustria e Suécia.
6. Transparência do governo e sua abertura à participação popular (processo administrativo aberto à participação pública; os projetos de lei e de regulamentos estão disponíveis ao público; as informações oficiais são razoavelmente acessíveis). Destaques: Suécia e Holanda.
7. Garantias da administração pública (regulamentos e normas administrativas são eficazes, aplicando-se sem influências "impróprias" e seguindo o devido processo, inclusive nas desapropriações que devem ser acompanhadas de adequada indenização).
Destaques: Suécia e Holanda.
8. Garantias da justiça civil (justiça civil imparcial, sem influências "impróprias", rápida, eficaz e acessível a todos).Destaques: Cingapura e Suécia.
9. Garantias da justiça penal (investigações eficazes, julgamentos céleres e efetivos, sistema correicional redutor de comportamento criminoso; sistema de justiça criminal imparcial, livre de influências "impróprias" e garantidor do devido processo legal). Destaques: Áustria e Japão.
10. Garantias de uma justiça informal, quando existente, a exemplo de cortes religiosas e tribais, célere, efetiva, imparcial, livre de influências "impróprias" e protetora dos direitos fundamentais.
Lamentavelmente o Brasil não foi considerado no estudo. Na América Latina, foram examinados Argentina, Bolívia, Colômbia, El Salvador, México, Peru e República Dominicana. Apenas a Argentina e México ficaram na escala média alta entre os países, divididos entre os de nível alto, médio alto, médio baixo e baixo.

Inside Job e a naturalização da injustiça

“Inside Job” [Trabalho 'Inteno'] é um documentário muito bom, mas com um potencial defeito: induzir-nos duas reações terríveis. Uma, nacionalista, a lamentar que tenha tirado o Oscar das mãos do lixo carioca, enlatado para gringo, é verdade, mas também um grande documentário. Um "Lixo Extraordinário". A outra reação é, todavia, mais grave.

Podemos terminar de ver o documentário com a sensação de que vivemos ainda em sociedade de castas ou de estados. E não podemos mudar o destino das coisas. Há os que nascem, vivem e morrem para trabalhar e se submeter aos rigores da lei, enquanto outros vêm ao mundo para fazer o que bem quiserem, furtando-se às consequências negativas de seus atos.

Uns são corpos e almas à disposição dos comandos e das normas. Outros são seres indiferentes às ordens morais e jurídicas. E imunes às suas penalidades. Podemos adotar duas atitudes em relação a essa injustiça natural. Uma é acreditar nas sanções espirituais. E nos conformarmos. Há um Deus que a tudo vê e, no juízo final, apurará as contas de cada um.

A segunda é professarmos outra crença: a de que poderemos ser um deles. Passaremos a vida a imitá-los, bajulá-los e defendê-los. Serviçais de seus prazeres, não custaremos a encontrar a saída. Dolorosa saída. Sequer cheiraremos o mesmo pó e, ainda por cima, pagaremos por tráfico. Sem direito de defesa.

Mas o documentário tem uma virtude poderosa. Não se trata apenas de apontar o cinismo do sistema capitalista ou a promiscuidade entre o poder político e o poder econômico. Há algo de revolucionário em seu final. Instigar-nos a um inside job mais proveitoso: em que mundo vivemos, convertidos, convencidos ou acomodados. E o que podemos e devemos fazer para mudá-lo.

domingo, 10 de abril de 2011

Altruísmo por necessidade de sobrevivência

Martin A. Nowak, diretor do Programa de Dinâmica Evolucionista na Universidade de Harvard, tem procurado mostrar que Darwin e, em particular, os seus seguidores não contaram a história toda sobre a evolução. Mutações aleatórias e a seleção natural são, de fato, instrumentos poderosos de mudança no mundo natural. Vantagens adaptativas geraram espécies triunfantes nos embates pela sobrevivência. Entretanto, segundo Nowak, a maioria das grandes inovações da vida na Terra, desde os genes às células até chegar às sociedades, foi movida por um terceiro motor: a cooperação. Juntamente com Roger Highfield, Nowak acaba de publicar Supercooperators. Altruism, Evolution, and Why We Need Each Other to Succeed, em que defende a sua tese. Para os autores, a linguagem, a cognição e a moralidade são produtos evolutivos da necessidade fundamental das criaturas sociais para cooperarem. Assim como a divisão de trabalho. O altruísmo, em síntese, foi produto da evolução. Leia a book review do NYT aqui

sábado, 9 de abril de 2011

Eleições para juízes [Sandy Levinson]

Sandy Levinson publicou no Balkanization, em 6/4/2011, um artigo, intitulado "Judicial elections", em que trata das vantagens e desvantagens de adoção de eleições para os postos judiciais. Ao mesmo tempo nos dá notícia das boas e más notícias do constitucionalismo dos Estados norte-americanos. Vale a pena conferir.

O que será que as pessoas de direita (ou de esquerda) pensam sobre eleições para a magistratura? A sabedoria convencional sobre as elites tradicionais "não foi bastante." Elas politizaram um processo que deveria, idealmente, ser dedicado à descoberta e à escolha dos "melhores homens e mulheres", que irão executar as tarefas de julgar de forma adequadamente não-política. O problema, claro, é que não há nenhuma razão para acreditar que retirar a competência de nomeação dos presidentes ou governadores "despolitiza" o processo. Pode até torná-lo ainda mais opaco.

Sandra Day O'Connor lidera atualmente uma campanha nacional contra o Poder Judiciário eleito nos Estados Unidos. Em uma reunião em Aspen, quase dois anos atrás, durante o qual eu moderei um painel entre ela e o justice Stephen Breyer, O'Connor lembrou a história de sua própria nomeação: Ronald Reagan queria um nome de mulher para a Suprema Corte, e encarregou William Smith, o seu primeiro Procurador Geral, para encontrar uma que fosse"republicana" com qualificações para assumir o cargo. A lista não era muito longa e a tinha como a primeira indicação. Talvez o processo de escolha pelo Executivo pudesse ser menos "político", por exemplo, se exigisse dois terços de votos para a confirmação ou passasse por comissões não partidárias (embora não se saiba exatamente como seriam selecionados e qual o significado do "não partidarismo" exigido). Entretanto, entre a seleção pelo Executivo (mesmo com a confirmação do Senado) e as eleições, há mais proximidade do que muitas pessoas imaginam.
Recomendo, a propósito, um livro a ser publicado pela historiador do direito em Harvard Jed Shugerman, "The People's Courts: The Rise of Judicial Elections and the Judicial Power in America" (Harvard U. Press), que observa que "Barnburners", na convenção constitucional de 1846 em Nova York, lutaram por eleições judiciais precisamente para evitar que os governadores de Nova York e seus comparsas no Legislativo colocassem os seus adeptos nas cortes, para delas obterem contrapartidas. As eleições judiciais foram vistas como uma forma de reforçar a independência do Poder Judiciário e, na verdade, a supremacia judicial vis-à-vis as legislaturas e executivos.
Agora, por uma boa razão, nós estamos bem cientes dos riscos ​​das eleições judiciais, mas ainda acho que é uma questão que precisa ser discutida. Tudo isso é uma forma de felicitar a maioria (apertada) dos eleitores de Wisconsin, que deu vitória a um juiz democrata contra um oponente conservador e republicano nas eleições para a Suprema Corte. Foi uma das poucas notícias realmente boas para muitos de nós, e eu presumo que ela deve colocar o temor de Deus (ou pelo menos de um eleitorado desperto) nos cálculos de muitos republicanos normalmente indiferentes. É realmente um absurdo para os republicanos ter prazer no fato de que Prosser [o candidato derrotado por uma ínfima margem] seja capaz de alcançar apenas um empate, se considerarmos que ele era inicialmente o favorito para ganhar as eleições supostamente não-partidárias, contra o que parecia ser um mero competidor democrata. Eu não tenho certeza de como realmente as eleições presidenciais do próximo ano serão interessantes, porque, neste momento, continua a ser impossível identificar um candidato republicano (exceto David Petraeus) que possa realmente vencer Obama. Mas haverá uma série de eleições absolutamente fascinantes, incluindo "recalls" e, para o cognescenti, a opção para os eleitores em Ohio de aprovar uma nova convenção constitucional no Estado.
Uma das coisas que isso revela é como são realmente diferentes (e mais democráticas) quase todas as Constituições estaduais em relação à Constituição nacional, certamente, a menos democrática dentre as 51 Constituições norte-americanas. Talvez isso seja bom, talvez não, mas certamente dá origem a eventos como o importante enfrentamento ocorrido em Wisconsin, e, neste momento, pelo menos, acho que é difícil argumentar que esta não é uma coisa boa. Menos interessante foi, na minha visão, o afastamento de três competentes juízes de Iowa por terem votado a favor do casamento homossexual numa decisão da Suprema Corte daquele Estado. Mas, naturalmente, não há Constituições perfeitas, e alguém tem que fazer o cálculo de "todas as coisas consideradas " para identificar que sistemas são preferíveis.

Os juízes erram: Associações podem demitir homossexuais

Em Boy Scouts of America et al. v. Dale (530 US 640, 2000), a Suprema Corte dos Estados Unidos reformou a decisão da Suprema Corte de Nova Jersey que obrigara ao Boy Scouts of America (BSA), uma associação civil sem fins lucrativos, a readmitir o assistente de Escoteiro-Chefe James Dale. Ele havia sido demitido ao assumir publicamente sua homossexualidade, o que fora tido por incompatível com os valores do BSA. A Corte Suprema entendeu que a decisão do tribunal inferior violara os direitos da BSA, especificamente a liberdade de associação. Uma organização privada, segundo o entendimento dos juízes, poderia excluir de seus quadros uma pessoa cuja "presença afetasse de forma significativa a capacidade do grupo para defender seus pontos de vista públicos ou privados. " A maioria dos juizes disse que a oposição à homossexualidade fazia parte da mensagem que o BSA visava transmitir para os jovens. A presença de homossexuais entre seus integrantes comprometeria os propósitos da organização, possibilitando que os que assumissem essa condição fossem demitidos de seus cargos. Um livro publicado em 2009, pelos professores Andrew Koppelman e Tobias Barrington Wolff, A Right to Discriminate? critica a decisão, afirmando, dentre outras coisas, que o tribunal adotou uma política discriminatória e semelhante ao racismo em relação aos homossexuais.

Dez regras para escrever melhor (The Guardian)

Há cerca de um ano, The Guardian publicou uma espécie de manual da boa escrita, ouvindo autores e críticos como Diana Athill, Margaret Atwood, Roddy Doyle, Helen Dunmore, Geoff Dyer, Anne Enright, Richard Ford, Jonathan Franzen, Esther Freud, Neil Gaiman,David Hare, PD James e AL Kennedy. Fizemos um apanhado das dez regras mais importantes que apontaram:

1. Não espere pela inspiração. Transpire, insista e não desista. A disciplina é o segredo (Esther Freud). Ironicamente Geoff Dyer também aconselha a escrever todos os dias. Criar o hábito de transcrever em palavras suas observações acabará virando instinto. Essa é a regra mais importante de todas, embora não a siga. Ironia à parte, é com o hábito da escrita que achará seu estilo. Disse Jeanette Winterson: “Discipline allows creative freedom. No discipline equals no freedom”.

2. Não esperar pela inspiração não significa descartá-la. Escute uma boa música, preste atenção numa fotografia ou pintura. Principalmente, leia muito e com seletividade. Péssima escrita, disse PD James, é contagiosa. As belas, as boas, também.

3. Leia em voz alta o texto escrito para ter certeza de que o ritmo das frases está bom. As prosas são complexas, não bastando apurar o ritmo apenas com o pensamento. Como escreveu Esther Freud, se não rolar um pouco de magia, está faltando algo.

4. Corte o supérfluo, o que não for essencial. Economia das palavras é a regra em todas as recomendações. Por todos, Sarah Waters: “Cut like crazy. Less is more”.

5. Confie na inteligência do leitor. Nem tudo precisa ser explicado (Esther Freud).

6. Escrever exige leitura, re-escrita, descarte. Use um dicionário e uma gramática pelo menos. Escrever é uma arte, um trabalho (com retrabalhos) e um jogo (Margaret Atwood). O dicionário é para situações de apuro. Como disse Roddy Doyle, a simplicidade deve ser a regra. A primeira palavra que vem à cabeça tende a ser a melhor. Para ele, o ideal é manter o dicionário num galpão no fundo do jardim ou atrás da geladeira, em algum lugar que exija caminhada ou esforço.

7. Teste o texto com amigos ou pessoas de sua confiança. Mas cuidado. Quando as pessoas dizem que, no texto, algo está errado ou não funciona bem para elas, quase sempre estão certas. Entretanto, quando dizem exatamente o que está errado e como corrigi-lo, quase sempre estão erradas. O lembrete é de Neil Gaiman.

8. Se travou, deu branco, é hora de parar um pouco. Mas não o bastante para perder a ideia e as palavras (Hilary Mantel). E o desejo.

9. Sempre tome nota de seus insights. A memória só retém informações por três minutos. Como as ideias surgem, muitas vezes, inesperadamente, não corra o risco de perdê-las (Will Self).

10. Pense sempre com Anne Enright:Only bad writers think that their work is really good”.

Regra não escrita: desconfie de todas as regras anteriores. E, se estiver seguro, descumpra algumas ou todas.